05/03/2010

Pequenos Heróis na catástrofe

Quatro equipas cinotécnicas da GNR estiveram envolvidas nas operações de busca e salvamento, ajudando a localizar várias vítimas do temporal que assolou a Madeira
Data: 05-03-2010 

Para Sacha e Timmy, a procura por vítimas é um mero jogo, uma maneira de receberem a desejada recompensa dos tratadores. Os dois cães da equipa de busca e salvamento da Guarda Nacional Republicana (GNR) estão longe de perceber o quão valioso é o trabalho que executam e que permite resgatar sobreviventes e cadáveres nos mais variados cenários de catástrofe, como sucedeu recentemente na Madeira.

Foram quatro (duas já retornaram ao continente) as equipas cinotécnicas da GNR envolvidas desde o passado dia 21 de Fevereiro nas árduas operações de busca e salvamento, desde Santo António à Serra de Água, passando pelo Monte e pelo centro do Funchal. Incorporadas em equipas de socorro que juntaram também bombeiros e outros polícias, foram incansáveis a percorrer de cima a baixo as zonas onde se alojaram as terras desprendidas das encostas, mais as ribeiras, a costa e os parques de estacionamento.

"Para eles é, de facto, um jogo, mas para nós, tratadores, salvar alguém no meio de uma catástrofe é uma sensação indiscritível, algo que não se consegue explicar", regista o 1.º sargento António Silva. "Costuma-se dizer que dar à luz é humano, salvar vidas é divino", acentua. Do mesmo modo que a recuperação de um corpo é também um contributo para que a família possa prestar uma última homenagem a quem faleceu.

Há 14 anos nesta brigada (a GNR foi pioneira na formação de equipas cinotécnicas em Portugal em 1996), o sargento António Silva desenvolve actualmente o seu trabalho em parceria com o Timmy - um 'border collie' com cinco anos. A outra equipa que se mantém na Madeira é composta pelo cabo Rui Cortez e pela Sacha, uma fêmea de raça 'golden retriever' e com seis anos. É importante referir que cada binómio homem/cão trabalha em exclusivo.

Vítima sinalizada pelo ladrar

O sinal de que foi detectada uma vítima é dado através do ladrar. Que, no entanto, pode ter algumas variantes que o tratador imediatamente reconhece. "Se o cão ladra convictamente há a certeza de que existe ali uma vítima", explica o militar da GNR. Se, por outro lado, "o cão não tem a certeza, ele fica na zona, cheira e raspa". Mas mesmo nestes casos é sempre dado o benefício da dúvida ao animal.

"O cão não é nenhum computador, mas normalmente nós dizemos que eles podem falhar na instrução, mas não falham na actividade normal", assinala. Muito embora seja certo que "um conjunto de factores no local podem influenciar o trabalho do cão", nomeadamente "a proximidade das pessoas"; mesmo que o animal esteja preparado para trabalhar ao mesmo tempo que as equipas de resgate. "Só que o trabalho fica mais dificultado", acrescenta, razão pela qual muitas vezes é solicitado que as pessoas se afastem dos locais de busca.

Estes cães especializadas em busca e salvamento têm a particularidade de estarem treinados "para agir em variados cenários", independentemente "de se fazer sentir frio ou calor", de as operações se efectuarem em zonas "de pedra, de lama, de neve ou de água", seja "em planície, montanha, serra ou mato denso", regista António Silva. "São cães que se adaptam perfeitamente a todos estes tipos de cenário, porque já os conhecem", regista o tratador.

Por detrás destas acções no terreno estão horas e horas de intenso treino, de ensinamentos que são incutidos no cão desde bem pequeno e onde a palavra 'busca' se assume, por norma, como ordem de comando. "Para o cão trata-se de uma espécie de jogo, onde a recompensa - que pode ser uma bola ou um outro qualquer objecto - só lhe é dada se ele cumprir o objectivo para que foi treinado", explica.

No caso concreto dos cães de busca e salvamento, o treino é feito de forma a que o cão, para receber a sua recompensa, tenha de detectar o odor humano. É por isso que, acrescenta o 1.º sargento António Silva, nos cenários de catástrofe "é importante irmos para o terreno nos primeiros cinco/seis dias", numa altura em que os corpos se encontram mais preservados.

Na Madeira, regista, as condições climatéricas ajudaram à realização das buscas. "O cão reage melhor perante o frio do que em situações de tempo mais quente, uma vez que a lama ajuda a preservar o corpos, enquanto o calor apressa as alterações", explica.

Equipas cinotécnicas chamadas ao estrangeiro

As equipas cinotécnicas da GNR já participaram em operações de busca e salvamento em catástrofes no estrangeiro, nomeadamente na Turquia (onde detectaram duas pessoas com vida, cinco dias após o terramoto), Irão, Argélia e Marrocos.

A GNR dispõe também de outros cães que desenvolvem variadas acções específicas: desde os pisteiros aos guarda-patrulha, passando pelos especializados na detecção de droga, de explosivos, de dvd's e até de agentes incendiários. No quadro desta força policial constam ainda cães especializados na detecção de sinais de sangue e um outro especificamente treinado para a localização de cadáveres no âmbito da investigação criminal.

O comando regional da Madeira da GNR também possui uma equipa cinotécnica que, contudo, não pôde participar nas operações desencadeadas neste temporal, devido ao cão se encontrar numa fase de convalescença.

Há várias raças de cães que revelam maior predisposição para as buscas e salvamento, a saber: 'pastor alemão', 'pastor belga Malinois', 'golden retriever', 'retriever labrador', 'border collie', 'cocker spaniel' e 'schnauzer miniatura'. O tempo de actividade de cada cão depende, para além da sua saúde, das características das raças.

António Gouveia guedes: "um motivo de orgulho para a GNR"

O comandante regional da Guarda Nacional Republicana (GNR), Tenente-coronel António Gouveia Guedes, faz questão de relevar a importância do trabalho desenvolvido pelas equipas cinotécnicas na Região.

"A GNR mandou para a Madeira os seus melhores elementos, cujo trabalho, como se pôde constatar, foi crucial para responder às exigências deste tipo de catástrofe", regista aquele responsável, lembrando que nestas situações específicas, onde se verificam vítimas soterradas, a acção das equipas cinotécnicas "é fundamental".

Gouveia Guedes acrescenta que estas equipas de socorro "são um motivo de orgulho para a GNR", sobretudo porque se trata de um trabalho "muito específico, que requer muito treino e muita experiência, e que só mesmo os especialistas é que o conseguem realizar". O comandante regional da GNR aproveita para salientar "o grande empenho e dedicação das equipas cinotécnicas", que, de resto, considera ter sido uma característica comum "a todas as entidades que colaboraram nas operações", bem assim aos próprios populares. "Cada um à sua maneira, todos contribuíram para o resultado que nós todos vemos: termos a Madeira, não direi numa situação de normalidade, mas já com uma imagem de recuperação", assinala.
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